Title: [LIVROS] RESENHA - 1Q84 LIVRO 1
Author: Jéssica Ohara
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Num mundo aparentemente normal, duas personagens - Aomame, uma mulher independente, professora de artes marciais, e Tengo, profess...
Num mundo aparentemente normal, duas personagens - Aomame, uma mulher independente, professora de artes marciais, e Tengo, professor de matemática - que não são o que aparentam e ambos se dão conta de ligeiros desajustamentos à sua volta, que os conduzirão fatalmente a um destino comum. Um universo romanesco dissecado com precisão Orwelliana, em que se cruzam histórias inesquecíveis e personagens cativantes.
Em 1Q84, Haruki Murakami constrói um universo romanesco em que se cruzam histórias inesquecíveis e personagens cativantes. Onde acaba o Japão e começa o admirável mundo novo em que vivemos? Uma ficção que ilumina de forma transversal a aldeia global em que vivemos.
"-Quando se faz algo incomum, as cenas cotidianas se tornam...Digamos que se tornam ligeiramente diferentes do normal. Isso já aconteceu comigo. Mas não se deixe enganar pelas aparências. A realidade é sempre única."
Há duas semanas atrás terminei de reler um dos meus livros favoritos que é 1984, não queria fazer uma resenha sobre ele porque o considero um clássico já extremamente explorado. Mas eu precisava falar dessa obra maravilhosa de algum jeito, então resolvi fazer uma leitura comparativa com o livro 1Q84, já sabia até o título "2+2=1Q84". Mas conforme fui lendo percebi que seria quase um pecado tentar "subjugar" a história desse livro com outro. Não com uma narrativa tão envolvente e personagens que seguem o surrealismo, eu comecei a pensar na história em todos os momentos e não podia mais parar. Haruki é um autor extremamente egoísta por não pensar que temos mais coisas para fazer da vida do que ler seus livros.
O diálogo que abre essa resenha é a mesma dita pelo taxista a Aomame, uma das personagens principais, e começa a dar o tom que será seguido. A todo momento a realidade é questionada e isso não se limita ao mundo que está no papel, o leitor passa a duvidar do que vê na vida real. Parecemos estar vivendo em um sonho que não acaba ao dar uma pausa na leitura, que continua na nossa mente. Não há uma enganação, ou truques, nos quais muda-se o foco de repente. A todo o momento o autor nos conta como será a história e mesmo assim somos surpreendidos. A pessoa acostumada a um tipo de jeito de narrativa, mais baseado na ocidental, vai mudar um pouco a sua perspectiva sobre literatura.
O livro segue uma forte ligação com a fantasia e algo sobrenatural, mas também aponta temas pesados que não tem nada de mágicos ou encantadores. A violência contra a mulher e a hipocrisia da própria sociedade japonesa é muito explorada. É interessante isso, pois tendemos a ver o Japão com uma lente de delicadeza e austeridade. Essa quebra de perspectiva me lembrou um pouco Millennium do Stieg Larson, onde falava sobre estupro, abusos e sofrimentos, vindo de um país, a Suécia, considerado de primeiro mundo, onde essas coisas seriam dificilmente associadas com a cultura local.
Essa conexão com a trilogia não está só no tema, mas em duas das protagonistas, Aomame e Fuka-eri, que escondem segredos de seus passados e tem personalidades fortes, lembrando muito nossa querida Lisbeth Salander.
Mas voltando a história, essas duas mulheres, de idades diferentes e talvez de mundos também, mostram uma sensibilidade peculiar: elas tem dons. Não no sentido mágico, mas algo como uma áurea e intuição. Elas podem ver mais do que aparentam. Durante a história é possível começar a ligá-las e entender que uma hora haverá um interseção em seus destinos.
O outro protagonista, Tengo, também tem esse aspecto, apesar de encarar os seus traumas de uma forma mais prática, o que não deixa de afetá-lo. O que eu percebi vendo os medos desses personagens é que ele pode causar um mal físico quando não se consegue enfrentá-lo.
O ramo literário é explorado na história, como é a maquinação do poder e como funcionam as críticas. Na verdade, grande parte do que acontece é referente a um novo livro inscrito num concurso de uma revista, o Crisálida de Ar. Talvez seja uma das coisas que me deixou mais curiosa. Haruki só solta trechos sobre como seria esse livro e em nenhum momento sabemos como é a história ou porque ela mexe tanto com as pessoas. O que se sabe é que ela é muito mais do que ficção, provavelmente a chave de um mistério que envolve agressão, o oculto, e o futuro de várias pessoas.
Há uma sensação durante a leitura de que uma hora começará algo que não estamos preparados e conforme as coisas vão se interligando isso fica cada vez mais forte. Devo admitir que temo, como só por poucos livros o fiz, pelas vidas desses personagens. Tanto pelos principais quanto os secundários. Eles têm segredos que eu nem posso imaginar e com duas luas no céu, tudo pode acontecer.