Vinicius tinha certeza de que seria dispensado do Exército. Como refratário, porém, não teve direito de escolha e acabou na companhia que fazia o trabalho mais pesado do batalhão. No começo, fez corpo mole, porém logo descobriu que sua atitude prejudicava os companheiros. Decidiu então dançar conforme a música. Lavar, correr, esfregar, pagar flexões... a rotina militar era dura, mas lhe trouxe amigos e um propósito. Só havia uma coisa com a qual ele não se acostumava: as humilhações do sargento Vieira. Para complicar, começa uma relação secreta com a filha do sargento. Com uma narrativa segura, Jessé Andarilho cria conflitos e reviravoltas que se escondem sob uma aparente normalidade e dá vida a um garoto comum, cheio de aspirações, em busca de si mesmo.
Eu não sou uma pessoa muito ligada em exército, no seu funcionamento e nas suas milhões de hierarquias. Na verdade, no último sete de setembro tinham vários caminhões enormes militares na minha rua, com muitos soldados, e distraída como sempre, achei que era a volta da ditadura, mas era só um desfile mesmo. Por isso que quando vi esse livro e soube da história do autor, senti que eu precisava expandir os limites da minha zona de conforto.
Vinicius é um jovem carioca, e se você que está lendo essa resenha conhece o mínimo do Rio, sabe que ele também é a cara do subúrbio, não desses da novela das oito, mas o do que pega o trem Santa Cruz todo dia para ir para a central. Ele perdeu a data certa do alistamento e por isso se tornou um refratário que teria obrigatoriamente servir. Ou seja, se ferrou bastante.
O jeito moleque dele me conquistou logo de cara, sempre divertido e com uma resposta melhor do que a outra. Bem semelhante a maioria dos meninos com os quais cresci por essas paragens esquecidas. O que eu mais gostei foi a oportunidade de lembrar, eu ainda moro no mesmo bairro, mas boa parte do tempo estou em outros lugares bem mais distantes fisicamente e socialmente. E ler esse livro em um primeiro momento me causou um estranhamento que logo se transformou em reconhecimento e também um orgulho de que nós somos resistência e adaptação.
Vinicius não queria estar no exército, mas ele logo percebe que vai ter que se integrar a situação para não sofrer mais. E o acompanhamos nessa jornada de humilhações e vida dura, mas que também tem muita amizade e jogo de cintura. Não é dizer que ele não se abate, mas ele sabe voltar em grande estilo. É um livro curto, mas que consegue ser certeiro. Demonstra como é o racismo cotidiano, como relações são sempre complicadas e como nunca podemos verdadeiramente abaixar a cabeça.
Efetivo Variável é um livro em parte autobiográfico porque o próprio autor serviu no exército, se você quiser saber mais sobre ele tem esse ótimo TEDx que ele deu.
Como disse na última resenha que sempre quero terminar as resenhas com indicações musicais para acompanhar a leitura. Hoje temos três:
Uma do Zeca Pagodinho (na verdade duas porque o que é bom vem em dobro): Atire a Primeira Pedra e Volta por Cima.
Um clássico do verão.
E uma daquelas boas de ouvir fazendo porra nenhuma na casa dos amigos
Esse livro foi gentilmente cedido pela Cia das Letras/Alfaguara ❤
AUTOR(A): Jessé Andarilho
PÁGINAS: 136
Gostei!
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