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Andressa Piccinini Andressa Piccinini Author
Title: VOX: O SILÊNCIO QUE ENSURDECE.
Author: Andressa Piccinini
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O¹ governo² decreta³ que⁴ as⁵ mulheres⁶ só⁷ podem⁸ falar⁹ 100¹⁰ palavras¹¹ por¹² dia¹³. A¹⁴ Dra¹⁵. Jean¹⁶ McClellan¹⁷ está¹⁸ em¹⁹ ne...


O¹ governo² decreta³ que⁴ as⁵ mulheres⁶ só⁷ podem⁸ falar⁹ 100¹⁰ palavras¹¹ por¹² dia¹³. A¹⁴ Dra¹⁵. Jean¹⁶ McClellan¹⁷ está¹⁸ em¹⁹ negação²⁰. Ela²¹ não²² acredita²³ que²⁴ isso²⁵ esteja²⁶ acontecendo²⁷ de²⁸ verdade²⁹.

Esse³⁰ é³¹ só³² o³³ começo³⁴...

Em³⁵ pouco³⁶ tempo³⁷, as³⁸ mulheres³⁹ também⁴⁰ são⁴¹ impedidas⁴² de⁴³ trabalhar⁴⁴ e⁴⁵ os⁴⁶ professores⁴⁷ não⁴⁸ ensinam⁴⁹ mais⁵⁰ as⁵¹ meninas⁵² a⁵³ ler⁵⁴ e⁵⁵ escrever⁵⁶. Antes⁵⁷, cada⁵⁸ pessoa⁵⁹ falava⁶⁰ em⁶¹ média⁶² 16⁶³ mil⁶⁴ palavras⁶⁵ por⁶⁶ dia⁶⁷, mas⁶⁸ agora⁶ as⁷⁰ mulheres⁷¹ só⁷² têm⁷³ 100⁷⁴ palavras⁷⁵ para⁷⁶ se⁷⁷ fazer⁷⁸ ouvir⁷⁹.

...mas⁸⁰não⁸¹ é⁸² o⁸³ fim⁸⁴.

Lutando⁸⁵ por⁸⁶ si⁸⁷ mesma⁸⁸, sua⁸⁹ filha⁹⁰ e⁹¹ todas⁹² as⁹³ mulheres⁹⁴ silenciadas⁹⁵, Jean⁹⁶ vai⁹⁷ reivindicar⁹⁸ sua⁹⁹ voz¹⁰⁰.




Vox foi uma das leituras mais difíceis que já fiz. Imagine você que o governo foi assumido por um presidente idiota que é controlado por um reverendo maligno e que o movimento de um país mais puro vem ganhando seguidores: é nesse momento em que mulheres perdem seus direitos e, também, suas vozes. 

É nesse cenário que encontramos a Jean, com um contador no pulso, escolhendo as palavras que irá usar para se comunicar com sua família e com medo do que sua filha de 6 anos poderá se transformar se continuar a viver dessa forma. 

Primeira coisa que senti foi angústia. Nos primeiros capítulos, a angustia de Jean é visível e transmitida pela autora. Ela transita entre memórias do passado, de quando os Estados Unidos ainda era um país de liberdade, quando mulheres podiam ler, escrever, se comunicar livremente, e do presente, onde sua filha mais nova vai a uma escola onde aprende como ser uma boa esposa, mas não sabe ler nem escrever, onde não pode perguntar como foi o dia de seus outros três filhos e precisa contar a palavras para que não leve um choque se ultrapassar as 100 permitidas. 

Pior que a angústia é raiva. Seu filho mais velho acredita em toda a baboseira do movimento purista e deixa isso claro. Em certo diálogo do passado, quando ainda estava no começo das mudanças e o ensino do movimento purista era uma matéria eletiva na escola, Steven fala que as mulheres deveriam parar de querer importância na sociedade (a.k.a trabalhos de importância e renome). O que ele quis dizer era que, por culpa delas, por que as mulheres estavam trabalhando fora e não cuidando das casas, é que os problemas do país estavam acontecendo. Jean, uma doutora de neurolinguística questiona se o trabalho dela não era importante e ele responde: não você, mãe. As outras mulheres. Parece impossível, mas é muito fácil mudar a ideologia de um país se os governadores desse país o queiram. 

Vox é cheio de críticas ao sistema patriarcal no qual vivemos e deixa isso bem claro. Patrick, o marido de Jean, trabalha para o governo, bem perto do presidente que impôs as novas regras e, mesmo sendo contra o sistema, não faz nada. Apenas o obedece. Em certa parte do livro, quando Jean fica sem o seu contador por uma noite e eles tem uma discussão, Patrick joga no ar que preferia quando ela não podia falar. Se fosse eu, teria dado um soco na cara de Patrick, e de Steven também, filho ingrato da p**ra.

Mas o que mais machucou ler foi cenas do passado de Jean, onde ela contava sobre uma colega de quarto e amiga, militante feminista. Eu vi um pouco de mim em Jean quando ela preferiu ficar em casa a ir a um protesto ou quando ela disse que não votou para a eleição de presidente. Ela foi passiva a situação, pois aos olhos dela aquilo nunca daria em nada. Nada iria mudar só porque o presidente era um purista. O livro não consegue ser mais atual, tendo em vista o cenário político atual, não apenas brasileiro com o último presidente eleito e algumas de suas ideologias como também o presidente Trump e seu discurso inflamado de ódio e nacionalismo.

O enredo de Vox se desenvolve quando Jean é chamada pelo próprio presidente para ajudar a encontrar a cura da afasia, algo que, antes de ser proibida de trabalhar, ela estava próxima de conseguir. Nessa parte o livro toma um caminho distópico, com conspiração nacional, resistência e morte, ainda trazendo a crítica social, como por exemplo quando um dos colegas que ela está trabalhando no laboratório reclama sobre o atraso e ela explica que precisou deixar a filha com alguém e ele refere que mulheres sempre tem desculpas, filhos, menstruação e hormônios e que esse era o motivo de não poderem mais trabalhar e que o ambiente era melhor agora. 

Em vários momentos eu gostaria de estar lá e apoiar Jean. Não é fácil ver o que está acontecendo e permanecer calada, mesmo que eu fosse apenas a leitora. Eu queria falar sobre, gritar de ódio. Mas, retirando a crítica social, o livro cai numa mesmice. Nada de novo, nada surpreendente e com um enredo de fácil previsão.

Vox nos deixa paralisado contra a injustiça e mostra como se deixar paralisar pode destruir um país, ainda mais se muitos pensarem que nada irá acontecer, que seu voto, sua opinião não farão a diferença. Prova de forma simples que é necessário lutar sempre, é como aquele poema de Niemöller: se você ignora quando estiverem retirando os direitos alheios, quando eles vierem retirar os seus, não haverá mais ninguém para protestar.



Autora: Christina Dalcher
Tradução: Alves Calado
Páginas: 320
Editora: Arqueiro
Lançamento: 2018

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Livro cedido pela Editora Arqueiro para resenha

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