
O conceito de vingança caracteriza muito do que vemos em filmes e séries e, na verdade, vem sendo tema de histórias há muito tempo, desde a Grécia Antiga se quisermos maior precisão. E porque isso se dá? Será porque a vingança é um instinto dentro de cada homem injustiçado? Talvez seja isso, já que muitos preferem chamar vingança de justiça. Porém, querendo ou não, não é propriamente justiça, mas se trata de justiça com as próprias mãos, que muitas vezes não nos pertence ou nos guia para situações nas quais não queremos mesmo estar. É isso que vemos em vários filmes e de diversas formas. Ora o protagonista é o vingador, ora é a vítima dessa vingança. Por vezes vinga um ente querido, e outras vezes algum personagem vinga sua própria vida perdida e sofrida por alguma injustiça que lhe foi imposta. Por vezes temos até mesmo uma vingança sobrenatural. Assim, como se trata de um tema amplo e com muitas vertentes, ficarei com alguns filmes e séries em que a vingança tem presença maior na trama, já que esta surge muitas vezes, mesmo que não seja a questão principal. Temos alguns livros que serviram também como inspiração para filmes devido ao impacto que o tema causa. Começemos, portanto.
Primeiramente é preciso dizer que qualquer vingança é sempre bem planejada. O que vemos nos filmes e séries são vinganças bem preparadas e pensadas que até mesmo deixam de importar, valendo mais o produto que sai disso tudo. É assim que temos filmes em que a vingança até chega a ser consumada, mas envolve algo a mais como em A Pele que Habito de Pedro Almodóvar em que um cirurgião plástico faz uma mudança radical no rapaz que violentou sua filha, e, no final de tudo, o rapaz se torna muito valioso para o cirurgião, devido ao trabalho que este teve para realizar sua vingança. Assim também temos filmes como Sweeney Todd – O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet de Tim Burton e Disque M Para Matar de Alfred Hitchcock. No primeiro filme, que se trata de um musical, um barbeiro, depois de ter sido preso injustamente, retorna à Fleet Street para se vingar do juíz da cidade, que foi responsável pela sua prisão e por roubar sua esposa e filha. Claro que a vingança nunca sai de foco durante o filme todo, mas há algo muito importante além disso: enquanto espera o tão desejado dia de sua vingança, Sweeney Todd vai treinando com sua lâmina e cortando gargantas aleatórias, que serviriam muito bem para as tortas de sua cúmplice, Mrs. Lovett. A história é inspirada em uma lenda urbana, que na verdade é considerada real por muitos ingleses. De qualquer maneira, fica claro aqui o que quis dizer com o produto da vingança, que seriam as tortas de carne humana. Já no filme de Hitchcock um jogador de tênis aposentado planeja a morte de sua esposa como vingaça por esta o ter traído, mas também conta com o dinheiro que herdará caso sua esposa venha a falecer.
Além desse tipo de vingança temos aquele em que o plano de vingar-se acaba ficando pela metade, pois o personagem acaba mudando de ideia. Isso é o que acontece em O Conde de Monte Cristo de Alexandre Dumas em que Edmond Dantès planeja sua vingança sem pressa, para que assim possa destruir por completo a vida daqueles que o deixaram por anos esquecido numa prisão, por falsas acusações de conspirar contra o novo regime na França, depois da queda de Napoleão Bonaparte. Assim, sob uma nova identidade, o conde de Monte Cristo estuda os alvos de sua vingança. No livro ele se vinga de todos, mas ameniza sua vingança quando esta chega em sua ex-amada com seu filho, que acabam ficando livres para reconstruir ou ao menos seguir seu futuro, assim como Dantès. Porém, no filme de Kevin Reynolds temos até mesmo um final com direito a arrependimento e retorno de Dantès com sua amada Mercedes. De qualquer maneira sua vingança não atinge plenamente a todos, pois o personagem ainda tem um futuro para construir, diferentemente dos personagens dos filmes anteriores, que são consumidos pela vingança. Vale lembrar que também Dantès ganha conhecimento em seu tempo na prisão, o que também vem a ser um produto mais importante do que a vingança em si.
Dessa maneira, também temos Senhora de José de Alencar, livro em que Aurélia, moça pobre abandonada pelo seu amado Fernando que só pensava em dinheiro, acaba recebendo uma grande herança que usa para se vingar de Fernando, casando com ele, mas alegando que o comprou. Dessa maneira, se nega a ter qualquer tipo de relação com Fernando e o trata muito mal. Porém, no final, quando Fernando decide deixar o dinheiro e sair do péssimo casamento, Aurélia volta atrás e renuncia à sua vingança para ficar com o amado, que agora não pensa somente em dinheiro. A vingança de Aurélia é, na verdade, um castigo, para que assim seu amado retorne para ele, e a vingança termina em um final até que feliz, assim como em O Conde de Monte Cristo. Não digo um final felizíssimo porque nada tão feliz assim pode sair de uma grande vingança. Aqui também cito Spartacus, série em que o personagem, escravo obrigado a lutar para sobreviver, se torna um verdadeiro gladiador com uma dor eterna, a de ter sido separado da mulher que ama. Claro que o ódio e desejo de vingança cresce cada vez mais dentro do personagem, que coloca tudo isso nas lutas em que deve vencer, como um verdadeiro gladiador. Portanto, a vingança fica em segundo plano, pois o fato de ele ser um escravo e gladiador é maior que sua vingança, assim com o amor de Amélia por Fernando e o desejo de ter um futuro de Edmond Dantès.

Contudo, ainda não falamos de um tipo de vingança que não podemos esquecer: a vingança autorizada, ou aquela vingança dos filmes americanos western, em que cowboys e assassinos cruéis do sertão se matam por vinganças familiares. Em Era uma Vez no Oeste de Sergio Leone vemos uma vingança dupla, já que dois atiradores, um matador de aluguel que assassinou um viúvo e seus filhos, e um atirador que protege a prostituta Jill, a esposa do suposto viúvo assassinado, já tinham um conflito, antes mesmo dessa família entrar no meio da história. É um do bom filme do gênero western, apesar de termos muitos por aí. Assim, também cito A Balada do Pistoleiro de Robert Rodriguez, que, cheio de lutas e banhos de sangue, trata da vingança de El Mariachi, um pistoleiro, pela morte de sua amada, que foi pega em uma intriga envolvendo um grande inimigo, chefe de uma espécie de máfia. Dessa maneira troca de tiros no meio da rua em plena luz do dia é normal para qualquer um, assim como no conto A Hora e Vez de Augusto Matraga de Guimarães Rosa, em que bandos com seus líderes andam arrasando e destruindo por deboche ou prova de que podem fazer o que desejam, até que um desses homens, Nhô Augusto, decide se vingar de seu inimigo que roubou seus capangas, e de sua esposa e filho, que o abandonaram. Porém a história muda de rumo para o personagem, que acaba se redimindo e encontrando a sua vez de agir corretamente.
Também temos aquelas vinganças tardias, em momentos que ninguém mais espera, ou até mesmo ignoram o fato de que possa haver algum tipo de vingança. É o caso, por exemplo, de Cabo do Medo de Martin Scorsese e O Dia do Terror de Jamie Blanks. O primeiro trata da vingança de um ex-presidiário que depois de acreditar ter sido preso injustamente por 14 anos, resolve se vingar de seu advogado, e acaba envolvendo a família deste. Já o segundo filme trata de um homem que busca se vingar de suas colegas de classe que no passado, o atormentavam diariamente. É uma vingança que leva muito tempo para ser elaborada, e na qual ninguém desconfia de quem seja o assassino. Dessa mesma maneira se dá a série Revenge, em que Amanda volta com outra identidade e em busca de vingança contra aqueles que destruíram sua família. Na verdade a série tem muito em comum com O Conde de Monte Cristo, ainda mais por essa questão da troca de identidade. Entre as vinganças tardias, dessa vez esperadas pelos inimigos, estão Kill Bill de Quentin Tarantino e Oldboy – Dias de Vingança de Spike Lee, em que as vinganças são certeiras. Claro que ao final de ambos os filmes acabamos por nos deparar com grandes surpresas por parte dos inimigos, que além de acabar com a vida dos protagonistas, ainda escondem segredos importantes, mas que não os livram da vingança alheia.

Nos resta abordar aquele tipo de vingança que não é pessoal, mas envolve um grupo maior e por vezes mais poderoso, o que torna a vingança mais desejável, porém mais difícil. Creio que nessa vertente se enquadram filmes como Código de Conduta de F. Gary Gray e V de Vingança de James McTeigue em que uma vingança que no início é de caráter pessoal acaba se tornando uma vingança contra o governo e as leis injustas que o compõe. Ambas as vinganças acabam saindo fora de controle, como era de se esperar, já que os protagonistas lidam com algo tão grande e poderoso. Também temos a série Nikita e o filme O Pacto de Roger Donaldson que lidam com questão parecida: os personagens buscam se vingar e acabar com organizações secretas e perigosas. Ainda podemos pensar em Menina Má.com de David Slade, em que uma adolescente busca fazer o que as autoridades não conseguem: acabar com pedófilos, de maneira cruel. Em todos os filmes citados existe uma espécie de vingança por todas as pessoas que sofreram e ainda sofrem com injustiças, com vistas a impedir que estas injustiças voltem a acontecer.
Por fim, cito uma última vingança, talvez a mais perturbadora, porque raramente se pode escapar: a vingança do mundo sobrenatural. É assim que A Maldição de Tom Holland e Arraste-me para o Inferno de Sam Raimi contam de maneira muito interessante e estranha algumas vinganças de idosos, um cigano e uma bruxa respectivamente, que simplesmente se irritam por não terem o que desejam. Assim jogam uma maldição em pessoas que jamais esperariam por isso, e vale dizer que são maldições no mínimo macabras. Vale citar Tamara de Jeremy Haft, que por vezes é subestimado, que mais uma vez traz uma vingança envolvendo feitiçaria, e que, como em O Dia do Terror, é de uma adolescente que se vinga de colegas de classe que a tratavam com crueldade. Falando em adolescentes cruéis também temos o memorável Carrie – A Estranha de Brian De Palma, que inclusive ganhou mais dois remakes, provavelmente até mesmo mais conhecidos do que o original.
Portanto, seja por bruxaria, por motivos pessoais grandes ou pequenos ou em busca de algo maior que si mesmo, a vingança está aí, bem diante de nós e vindo de diversas maneiras, sempre buscando se renovar e trazer algo diferente para impressionar e deixar de queixo caído a nós, meros telespectadores da injustiça e revolta alheias.