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Title: A VERDADE CRUEL, VISCERAL E NECESSÁRIA DE BIG LITTLE LIES
Author: Diário de Seriador
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Este texto poderá conter alguns spoilers da série e do livro: Pequenas Grandes Mentiras! A série foi lançada e se tornou fenômeno em 2...

Este texto poderá conter alguns spoilers da série e do livro: Pequenas Grandes Mentiras!

A série foi lançada e se tornou fenômeno em 2017. Ganhou todos os prêmios aos quais tinha direito e merecidamente. Infelizmente (ou felizmente, acho que vi no momento certo) eu assisti a série apenas esse ano e, logo em seguida, li a obra literária e gostaria de conversar a respeito com vocês.  

Nós precisamos falar sobre as pequenas mentiras diárias das personagens que guiam a história. As pequenas mentiras que guiam as histórias de muitas mulheres reais mundo a fora. 

Celeste, Madeline e Jane, são as mães protagonistas dessa narrativa que se inicia quando um crime ocorre numa noite de perguntas e respostas, oferecida aos pais dos alunos, na escola de Pirriwee (Austrália). Não se sabe, no entanto, quem foi a vítima ou quem cometeu o crime. E, então, somos convidados a voltar no tempo para conhecermos os personagens e os fatos que nos levaram a esse trágico acontecimento. 

Aqui, o crime acaba virando apenas pano de fundo para uma história muito mais complexa e muito mais dura, nos mostrando que sim: pequenas mentiras podem ser letais. Jane, que havia recém se mudado para a cidade com seu filho, o pequeno Ziggy, logo enfrenta problemas quando seu filho é acusado de praticar bullying na escola.  Logo no inicio, Jane acaba se tornando amiga de Madeline que tem seus filhos estudando na mesma escola de Ziggy e possui um relacionamento conturbado com seu ex marido. É, também, por intermédio dela que Jane acaba conhecendo a estonteante Celeste: linda, rica, casada com o homem perfeito e com a vida perfeita. 


Mas nem tudo é o que parece não é mesmo?

O livro é narrado em terceira pessoa e o foco dos capítulos se reveza entre essas três mulheres, sempre nos mostrando algo novo da história (bem densa) de cada uma delas. Essa narrativa debate assuntos necessários e que precisam de atenção como o bullying, o abuso sexual e violência doméstica. 

Violência doméstica e relacionamento abusivo são coisas que podem acontecer com qualquer pessoa e não é fácil sair deste tipo de relacionamento, este é o primeiro ponto que a autora quer deixar claro e abrir nossos olhos. Em uma noite que acabe mal, onde a pessoa acaba sendo violada fisicamente e psicologicamente, a culpa NUNCA e JAMAIS será da vítima. Este é outro ponto que precismos ter em mente para o debate a cerca deste livro.

A narrativa de Liane Moriarty me encantou. As quase 400 páginas se passaram mais rápido do que eu poderia imaginar e foi um livro que eu não consegui largar até terminar (literalmente, já que o li em praticamente um dia!). Nesta história percebemos um jogo de aparências e de como temos medo de sermos julgados pelas pessoas que nos rodeiam, onde a autoestima está ligada a forma como você é vista pelas outras pessoas. O medo de revelar as pequenas grandes mentiras que escondemos no fundo do armário, com medo de serem descobertas. 

Não me lembro de ter lido (ou visto) cenas de violência doméstica e o debate sobre abandonar ou não este relacionamento abusivo, de uma maneira tão visceral e complexa como na narrativa de Liane. Você percebe o sofrimento dessa mulher, ela percebe o próprio sofrimento. Mas vocês percebem, também, a confusão mental e os inúmeros "mas". 


"Mas e os filhos?"
"Mas, e se eu não tivesse falado isso?"
"Mas, e seu tivesse agido diferente?"

Mas. 

A questão do abuso sexual, verbal e a agressão física de um relacionamento abusivo são tratados com uma verdade absurda e, também, de uma maneira fácil de entender. Entender que em um relacionamento abusivo existe um troca de poder silenciosa, que vai do momento que um apanha, até o momento do remorso de quem bateu acabar, até os hematomas sumirem e até essa pessoa se sentir com  poder de novo. É um ciclo vicioso e muito difícil de se encerrar e justamente por isso, este assunto precisa ver a luz do dia. 

Essa leitura já começou deixando meu 2018 mais reflexivo, dando aquela pontada de dor e de entendimento. Ser mulher é lidar com questões como essas: de abuso (em todos os seus aspectos) até mesmo sobre ter ou não uma profissão. Ser dona de casa e cuidar dos filhos ou trabalhar e passar pouco tempo com eles? É, também, saber que você será julgada independente da sua escolha. Ser mulher e ler este livro é entender o medo que acompanha a frase "E se fosse comigo?" e a dor de perceber que você jamais vai saber o que faria e o que as pessoas que passaram por essas situações sentem. 


É uma história que mostra como uma amizade entre mulheres como existir além do assunto compras, shopping e homens. É mostrar que as mulheres podem estar a frente de suas histórias e terem suas histórias contadas. Infelizmente, alguma mulher que leu este livro pode ter sido abusada sexualmente ou pode apanhar do marido em casa. Essa mulher pode ter medo de falar e pode ter se sentido representada e compreendida nessa história. Os números dessa violência só aumentam e, ainda assim, não condizem com a realidade, pois, muitos casos não são reportados (seja por vergonha, medo ou qualquer outra razão).

Essa é a importância desse livro. As histórias estão acontecendo o tempo todo ao seu redor, e você não se dá conta disso porque parece uma realidade distante de você. É importante elas abrirem os olhos. É importante todos abrirem os olhos. Aqui, as mulheres são as protagonistas e lideram a história, os homens são coadjuvantes que ajudam a trama a fluir como um todo. Os erros, os acertos e os medos do que significa de fato ser mulher estão aqui e de maneira sensacional. 

Violência contra a mulher é real e é, infelizmente, cotidiana. O assunto precisa ser falado para ser vencido, amigos. 

A SÉRIE DA HBO...

Série e livro são maravilhosos, porém, apresentam algumas diferenças.  Na série da HBO, exibida em 2017, as responsáveis por darem vida a essas personagens são Nicole Kidman (Celeste), Reese Whiterspoon (Madeline) e Shailene Woodley (Jane). A série foi o grande destaque das premiações levando Emmy, Globo de Outro e tudo mais que tinha direito nas categorias as quais concorreu. Sendo Nicole Kidman O nome do ano e levando todos os prêmios aos quais foi indicada, muito merecidamente porque a atuação dela está absolutamente impecável. 


A série, que conta com Reese e Nicole como produtoras, se passa em um ambiente diferente do livro. Enquanto a obra literária se passa na Austrália, a mini série se passa na Califórnia, na cidade praiana de Monterey. E essa é apenas a primeira de muitas mudanças que vemos entre um e outro. 

Existem mudanças sutis e que não afetam de forma alguma a narrativa da série, como por exemplo, o fato de no livro Madeline ter um filho do meio, chamado Fred, que não existe na série. Porém, algumas mudanças e plots adicionados destonaram muito entre as duas coisas e eu preferi, sim, a versão literária dos fatos. Principalmente no que diz respeito a personagem de Reese e até mesmo a história da virgindade de Abigail, filha mais velha de Madeline, e como ele se encerra (o final dessa história no livro é muito mais elaborado e pensado). 

Uma coisa que achei positiva dentre essas mudanças foram as sessões de terapia. Na série, Perry e Celeste vão as sessões juntos (no livro ela vai sozinha) e essas são algumas das minhas cenas favoritas da série. Elas são densas, são pesadas, te colocam pra chorar e, tudo isso, sem ensaio prévio meus amigos. Nicole disse em uma entrevista que aquelas cenas nunca foram ensaiadas por eles antes. Era chegar, sentir e gravar. E que ela ficou tão abalada com essas cenas quanto nós. As cenas de agressão, também, não são fáceis de assistir e de digerir, assim como as cenas do abuso sofrido por Jane. São cenas que te marcam e são feitas justamente com esse intuito.

O elenco como um todo da série é primoroso. Laura Dern roubou a cena interpretando Renata com uma sensibilidade linda de assistir (e que lhe rendeu Emmy e Globo de Ouro!). Zoe Kravitz faz com que fique difícil odiar a madrasta tão "good vibes". Reese nos entrega a Madeline como nenhuma outra atriz poderia. Nicole nos entrega uma de suas melhores atuações e torna Celeste o personagem marco da série, aquela personagem que apenas com um olhar já diz absolutamente tudo. Alexander, interpreta o violento Perry de uma maneira absurdamente real. Shailene embora não tenha de destacado na série dentre esse timaço de atores, consegue nos mostrar a vulnerabilidade misturada com força de Jane em uma atuação bastante satisfatória. 


A forma como as histórias das personagens se ligam e a sequencia de eventos é muito bem explorada no livro e a série deixa um  pouco a desejar nesse aspecto, bem como a história dos personagens secundários que explicam determinadas ações dentro da obra. O final do livro é infinitamente superior ao da série (que já é fenomenal) justamente por isso, você entende o porque dos personagens e entende, também, a questão da sororidade essencial no final do livro. 

Big Little Lies, que terá segunda temporada em 2019, virou uma das minhas séries favoritas da vida toda. Os sete episódios te aguçam, te incomodam, te fazem querer sair gritando como aquilo é errado. Te fazem pensar e por isso sabemos que estamos no caminho certo.

É uma série de mulheres fortes, que aguentam mais do que julgavam poder. Embora seja diferente do livro em muitos aspectos não deixa nada a desejar no sentido "série". Ambas são sensacionais, com destaque para a fotografia e trilha sonora da série que encanta desde a abertura!

Dê uma chance a Big Little Lies, leia, assista e sinta. A história é dura na mesma medida que é necessária. E vai ter segunda temporada, viu?! Com direito a Meryl Streep no elenco! O livro não tem continuação, então, ficará a cargo dos roteiristas e produtores levar essa história a diante, com responsabilidade dobrada! Então, se você não assistiu: Corre. E se já assistiu, me abraça enquanto esperamos junto essa temporada que promete muito!

PS: Caso você presencie uma agressão à mulher ou sinta alguma ameaça que isto aconteça, você pode denunciar anonimamente no número 180. E você, mulher, que se sentir ameaçada ou passar por alguma situação de abuso: denuncie. O maior aliado do agressor é sempre o silêncio. 

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