Primeiro, o imprevisível: a quebra de segurança em uma instalação secreta do governo norte-americano põe à solta um grupo de condenados à morte usados em um experimento militar. Infectados com um vírus modificado em laboratório que lhes dá incrível força, extraordinária capacidade de regeneração e hipersensibilidade à luz, tiveram os últimos vestígios de humanidade substituídos por um comportamento animalesco e uma insaciável sede de sangue.
Depois, o inimaginável: ao escurecer, o caos e a carnificina se instalam, e o nascer do dia seguinte revela um país – talvez um planeta – que nunca mais será o mesmo. A cada noite a população humana se reduz e cresce o número de pessoas contaminadas pelo vírus assustador. Tudo o que resta aos poucos sobreviventes é uma longa luta em uma paisagem marcada pelo medo da escuridão, da morte e de algo ainda pior.
Enquanto a humanidade se torna presa do predador criado por ela mesma, o agente Brad Wolgast, do FBI, tenta proteger Amy, uma órfã de 6 anos e a única criança usada no malfadado experimento que deu início ao apocalipse. Mas, para Amy, esse é apenas o começo de uma longa jornada – através de décadas e milhares de quilômetros – até o lugar e o tempo em que deverá pôr fim ao que jamais deveria ter começado.
A passagem é um suspense implacável, uma alegoria da luta humana diante de uma catástrofe sem precedentes. Da destruição da sociedade que conhecemos aos esforços de reconstruí-la na nova ordem que se instaura, do confronto entre o bem e o mal ao questionamento interno de cada personagem, pessoas comuns são levadas a feitos extraordinários, enfrentando seus maiores medos em um mundo que recende a morte.
Sabe quando você vê aquele livro com o nome estranho e a capa diferente na livraria e simplesmente se apaixona? Não foi assim com A Passagem. No longínquo 2013, eu não amei o que eu vi, mas fiquei curiosa o suficiente para ler a sinopse e depois de um leve choque com o que estava escrito e o que sugeria o título, resolvi dar uma chance. Melhor decisão ever.
Há autores que sabem escrever uma história apocalíptica, sabem juntar os elementos como em uma receita e o resultado sai certo. Mas “certo” não é o tipo de coisa que nos marca, o que causa uma real impressão é “perfeito” ou além disso “devastador”. Cronin nos leva a essa última categoria, ele não faz personagens que poderíamos imaginar, ele faz personagens que se nós olharmos para o lado eles estarão lá.
É uma história toda encadeada, da qual podemos ter certeza que aquele personagem que passou por 5 minutos no primeiro capítulo, ainda dará o ar da graça de forma decisiva no final. Nada é escrito só para preencher um buraco. Afinal, ele não trata as tramas de forma rotineira, estamos falando do fim da vida como a conhecemos.
Partindo de algo já clichê, uma invenção do governo que deu errado sério, qual dá certo? Um vírus é criado e as cobaias são ex-condenados. Nessa parte, que poderia ser só o relato de como houve essa fuga em massa, nós somos colocados diante de uma questão ética muito forte: Até que ponto temos direito sobre a vida de outros? Mesmo que esses tenham cometidos atrocidades? Por isso somos autorizados a vingança justa?
Esses zumbis/vampiros que são libertos e começam a infectar outros, ao meu ver são os menos monstruosos de toda a história. Todo esse primeiro livro é contado a partir da ideia de que eles sentem dor, e que a sociedade causou todo esse sofrimento. E que não começou a partir da infecção, ou antes mesmo deles serem testados, mas antes, na própria construção social em que todos estavam inseridos.
Há uma personagem principal, Amy. Uma criança que foi usada no experimento, seria o último teste para o vírus. Ela se tornou especial, na verdade todos os primeiros usados se tornaram diferente dos outros, líderes de matilhas, por assim dizer. Ela é diferente deles, não era uma criminosa, mas cresceu cercada por diversos tipos de violências: separações, perdas, abandonos e morte.
É Amy a constante durante toda a epidemia, todas as noites de horror, ela vive entre dois mundos, um humano e outro bestial. Ela pode ouvir as criaturas e sentir sua dor. São décadas vivendo e vendo isso, sentindo os últimos vestígios de construção humana serem apagados. Mas não a humanidade. Ela também é retratada como uma praga que não consegue ser dizimada, que sobrevive nas condições mais adversas.
O livro segue três linhas temporais que se misturam: O Antes, o Durante e o Agora. Algumas vezes não é fácil distinguir entre elas, aos poucos é que se fazem as ligações. Há a Colônia que se protegeu por anos com potentes luzes, mas que agora está morrendo e há a andarilha que chega com uma nova promessa de esperança. Nesse lugar, outros personagens aparecem que continuaram sua jornada em uma forma de encontrar alguma salvação para a raça humana.
Eu farei as resenhas dos próximos dois livros da saga, e aí poderemos discutir, com spoilers, alguns elementos desse épico que teve seu último livro lançado no Brasil esse ano. Até mais!
AUTOR(A): Justin Cronin
PÁGINAS: 816
EDITORA: Editora Sextante / Arqueiro
LANÇAMENTO: 2010 / 2013